Anticorpo Monoclonal Donanemab Atrasou Progressão do Alzheimer em Estágio Inicial: Estudo Clínico Revela Eficácia em Reduzir Sintomas

Estudo clínico de fase 3 demonstrou que o anticorpo monoclonal donanemab reduziu significativamente a progressão clínica do Alzheimer em pacientes com patologia amiloide e tau. Saiba mais sobre os resultados e efeitos colaterais.

Fábio H. M. Micheloto

10/14/20244 min read

Donanemab, anticorpo experimental, mostrou resultados promissores na desaceleração da progressão clínica do Alzheimer em estágio inicial.

O tratamento do Alzheimer, uma das principais doenças neurodegenerativas do mundo, ainda é um grande desafio para a medicina moderna. Com opções terapêuticas limitadas, a busca por tratamentos eficazes que retardem a progressão dos sintomas é um foco constante de pesquisas. Recentemente, um estudo de fase 3 trouxe uma nova esperança: o anticorpo monoclonal donanemab, desenvolvido para eliminar as placas de amiloide no cérebro, mostrou resultados promissores na desaceleração da progressão do Alzheimer em pacientes com a doença em estágio inicial.

Publicado em uma revista internacional de alto impacto, o estudo foi realizado com 1.736 participantes que apresentavam sintomas iniciais da doença de Alzheimer e patologia tanto de amiloide quanto de tau, dois biomarcadores importantes da doença. O objetivo principal era avaliar se o donanemab poderia proporcionar benefícios clínicos para esses pacientes.

Desenho do Estudo e Metodologia

A pesquisa foi conduzida em centros médicos de oito países, em um formato multicêntrico, randomizado, duplo-cego e controlado por placebo. O período do estudo foi de 18 meses, começando em junho de 2020, e o último acompanhamento foi realizado em abril de 2023. Para participar, os indivíduos deveriam apresentar comprometimento cognitivo leve ou demência leve, associados à patologia amiloide cerebral e níveis variáveis de tau (baixo, médio ou alto), identificados por meio de exames de tomografia por emissão de pósitrons (PET).

Os participantes foram divididos aleatoriamente em dois grupos: 860 indivíduos receberam o donanemab por via intravenosa a cada quatro semanas, enquanto 876 indivíduos receberam placebo. Caso certos critérios de dose fossem atingidos, os participantes do grupo donanemab foram transferidos para placebo de forma oculta.

O principal resultado avaliado foi a mudança na pontuação da Escala Integrada de Avaliação da Doença de Alzheimer (iADRS) ao longo de 76 semanas. A iADRS é uma escala de 0 a 144 pontos, onde pontuações mais baixas indicam maior comprometimento. Outros desfechos importantes incluíram mudanças na pontuação da Escala Clínica de Avaliação da Demência (CDR-SB), que varia de 0 a 18 pontos, onde maiores valores indicam piora dos sintomas.

Resultados Principais

O estudo revelou que o donanemab foi capaz de desacelerar a progressão clínica da doença em pacientes com patologia de tau baixa e média, assim como na população combinada (todos os níveis de tau). Após 76 semanas de tratamento, a mudança média na pontuação iADRS foi de -6,02 no grupo donanemab, em comparação a -9,27 no grupo placebo, na população de tau baixo/médio. Na população combinada, as mudanças foram de -10,19 e -13,11, respectivamente. Esses resultados foram considerados estatisticamente significativos, indicando que o donanemab teve um impacto mensurável na desaceleração dos sintomas da doença.

Além disso, os dados da escala CDR-SB reforçaram os achados. Na população de tau baixo/médio, a mudança foi de 1,20 para os pacientes tratados com donanemab, em comparação a 1,88 no grupo placebo. Já na população combinada, a mudança foi de 1,72 com donanemab e 2,42 com placebo.

Esses resultados são particularmente relevantes porque sugerem que o tratamento pode ser mais eficaz em fases iniciais da doença, especialmente em pacientes com patologia tau menos avançada. Isso fortalece a hipótese de que intervenções precoces têm maior potencial para modificar o curso do Alzheimer.

Efeitos Colaterais e Segurança

Embora os resultados sejam promissores, o tratamento com donanemab também apresentou riscos. Um dos efeitos adversos mais preocupantes foi a ocorrência de anormalidades em imagens relacionadas ao amiloide, como edema cerebral ou efusão, em 24% dos participantes tratados com o anticorpo. Desses, 52 indivíduos manifestaram sintomas associados a essas condições. No grupo placebo, essas anormalidades foram observadas em apenas 2,1% dos participantes, sem que houvesse sintomas.

Outro efeito adverso significativo foi a reação associada à infusão intravenosa, que ocorreu em 8,7% dos indivíduos no grupo donanemab, comparado a 0,5% no grupo placebo. Além disso, três mortes no grupo donanemab e uma no grupo placebo foram consideradas relacionadas ao tratamento, levantando a necessidade de monitoramento rigoroso durante o uso desse medicamento.

Implicações para o Futuro

Os resultados do estudo com donanemab são encorajadores, pois mostram que a remoção das placas de amiloide no cérebro pode ter um impacto positivo na progressão clínica do Alzheimer. No entanto, os riscos associados ao tratamento, incluindo as anormalidades cerebrais e as reações à infusão, sugerem que mais estudos são necessários para entender completamente os benefícios e os perigos do uso prolongado do medicamento.

Além disso, o impacto do donanemab foi mais pronunciado em indivíduos com níveis baixos a médios de patologia tau. Isso sugere que a eficácia do tratamento pode estar diretamente relacionada ao estágio da doença no momento do início da terapia. Esse dado é importante para orientar futuros estudos e determinar em que fase do Alzheimer os pacientes devem ser tratados com anticorpos monoclonais.

Perspectivas Terapêuticas

A busca por tratamentos eficazes para o Alzheimer continua sendo uma das maiores prioridades da medicina moderna. Embora existam tratamentos que aliviam os sintomas da doença, como os inibidores da colinesterase e os moduladores do glutamato, até agora nenhum medicamento demonstrou desacelerar de forma consistente a progressão da doença.

O donanemab, assim como outros anticorpos monoclonais que visam eliminar as placas de amiloide no cérebro, como o aducanumabe, representam uma nova abordagem terapêutica promissora. No entanto, os resultados obtidos até o momento indicam que esses tratamentos não são isentos de riscos e que a seleção cuidadosa dos pacientes será essencial para maximizar os benefícios e minimizar os efeitos adversos.

Conclusão

O estudo de fase 3 sobre o donanemab traz uma nova esperança para o tratamento do Alzheimer em estágio inicial, demonstrando que o medicamento pode desacelerar significativamente a progressão da doença, especialmente em pacientes com níveis mais baixos de patologia tau. No entanto, os riscos associados ao tratamento indicam que mais pesquisas são necessárias para avaliar plenamente a segurança e a eficácia do medicamento a longo prazo.

À medida que a ciência continua a avançar, a expectativa é que tratamentos como o donanemab possam eventualmente oferecer uma forma eficaz de modificar o curso do Alzheimer, proporcionando uma melhor qualidade de vida para milhões de pessoas ao redor do mundo que sofrem com essa devastadora doença neurodegenerativa.

Fonte: https://jamanetwork.com/journals/jama/article-abstract/2807533