Biomarcadores no Sangue: A Nova Fronteira para Diagnóstico de Alzheimer nos Cuidados Primários e Secundários

Um novo exame de sangue promete revolucionar o diagnóstico de Alzheimer ao identificar a doença com alta precisão em ambientes de atenção primária e secundária. Saiba como a tecnologia baseada em biomarcadores como tau fosforilado e beta-amiloide pode transformar o futuro do tratamento de pacientes com sintomas cognitivos.

NEUROCIÊNCIAS

Fábio H. M. Micheloto

11/10/20245 min read

Nas últimas décadas, o diagnóstico da doença de Alzheimer (DA) evoluiu, mas ainda apresenta desafios significativos, especialmente para identificar a condição de forma precoce e com precisão em ambientes de cuidado primário. Recentemente, cientistas na Suécia desenvolveram um exame de sangue que utiliza biomarcadores específicos para detectar a doença com alta precisão, oferecendo uma nova esperança para pacientes e médicos na linha de frente dos cuidados de saúde. A tecnologia, conhecida como APS2 (Amyloid Probability Score 2), combina a análise de proteínas tau fosforilada 217 (p-tau217) e beta-amiloide 42/40 para determinar a probabilidade de presença de Alzheimer.

Esse exame é promissor, pois fornece um diagnóstico que se aproxima do realizado por especialistas em demência e supera a acurácia dos métodos tradicionais utilizados por médicos de atenção primária. O uso desses biomarcadores pode reduzir a necessidade de exames invasivos e caros, como tomografias ou punções lombares, além de otimizar o tempo de resposta para pacientes que precisam de tratamento urgente.

Como Funciona o Teste APS2?

O APS2 é realizado com base em uma amostra de plasma e utiliza espectrometria de massa para analisar a relação entre o tau fosforilado 217 (p-tau217) e o tau não fosforilado, expresso como a porcentagem de p-tau217. Junto a isso, é analisada a proporção entre beta-amiloide 42 e beta-amiloide 40 (Aβ42

β40), que também é um marcador importante da patologia da DA. Essa combinação de biomarcadores fornece um indicador robusto da presença de Alzheimer, sendo mais específico do que exames tradicionais.

Entre fevereiro de 2020 e janeiro de 2024, 1.213 pacientes na Suécia foram submetidos a esse exame como parte de uma avaliação clínica para sintomas cognitivos, com coortes divididas entre cuidados primários e secundários. O estudo analisou os resultados com um ponto de corte já definido em uma coorte independente, o que aumenta a confiabilidade dos resultados.

Alta Precisão em Cuidados Primários e Secundários

Um dos principais resultados do estudo foi a alta taxa de precisão do APS2 tanto em ambientes de cuidados primários quanto secundários. A precisão diagnóstica do APS2 variou entre 88% e 92%, enquanto especialistas em demência, utilizando métodos tradicionais, alcançaram 73% de precisão, e médicos de atenção primária, 61%. Esse aumento de precisão é significativo, pois mostra que o APS2 pode ser um recurso valioso para médicos que atuam na linha de frente, ajudando-os a identificar a doença de maneira precoce e com maior segurança.

O exame também apresentou valores preditivos positivos e negativos elevados, o que demonstra que ele é capaz de identificar tanto pacientes com Alzheimer quanto aqueles sem a doença com alta confiabilidade. Em ambiente de cuidados primários, o valor preditivo positivo (PPV) foi de 91% e o valor preditivo negativo (NPV) foi de 92%, enquanto, no ambiente de cuidados secundários, o PPV foi de 88% e o NPV de 87%. Esses dados revelam o potencial do exame para uso em ambientes variados, onde recursos e especializações podem ser limitados.

Impacto para Médicos de Atenção Primária

Para médicos de atenção primária, que frequentemente lidam com casos iniciais de sintomas cognitivos, o APS2 representa um avanço significativo. Em comparação com exames clínicos tradicionais, que dependem de avaliação cognitiva e tomografia computadorizada, o APS2 mostrou uma precisão diagnóstica de 91%, contra apenas 61% dos métodos convencionais. Essa diferença é especialmente importante para os casos iniciais de Alzheimer, que muitas vezes são difíceis de identificar sem o uso de biomarcadores específicos.

Dessa forma, o APS2 pode não apenas facilitar a triagem em consultórios de atenção primária, mas também ajudar os profissionais a encaminharem os pacientes para cuidados especializados de forma mais eficaz e precoce, evitando a progressão desnecessária dos sintomas até um ponto em que intervenções médicas se tornem mais complexas.

Especialistas em Demência e a Eficácia do APS2

Mesmo para especialistas em demência, que possuem experiência aprofundada na identificação de Alzheimer, o APS2 se mostrou um recurso importante. Os resultados do estudo mostraram que, utilizando o APS2, especialistas em demência aumentaram a precisão do diagnóstico de 73% para 91%. Isso indica que, ao integrar o APS2 no processo de avaliação clínica, é possível reduzir o risco de diagnósticos incorretos ou imprecisos, além de otimizar o tempo de resposta para pacientes e suas famílias.

Para pacientes e cuidadores, essa precisão adicional pode fazer uma diferença fundamental, pois ajuda a reduzir a ansiedade causada pela incerteza do diagnóstico e permite que decisões de tratamento sejam tomadas mais rapidamente.

O Futuro do Diagnóstico de Alzheimer e o Papel dos Biomarcadores

O uso de biomarcadores como o APS2 na detecção de Alzheimer representa uma mudança de paradigma na forma como abordamos a doença, especialmente em suas fases iniciais. Com base nos resultados desse estudo, o APS2 possui o potencial de ser amplamente adotado como uma ferramenta de diagnóstico de primeira linha para profissionais de saúde que atendem em clínicas e consultórios de atenção primária e secundária.

Ainda assim, é importante destacar que a utilização de biomarcadores em exames de sangue para Alzheimer é uma área em constante evolução. Novos estudos são necessários para avaliar o impacto desse exame na prática clínica diária e para explorar como a incorporação do APS2 pode melhorar o manejo e o acompanhamento de pacientes com sintomas cognitivos.

Conclusão

O desenvolvimento do APS2 é um marco na história da medicina diagnóstica de Alzheimer, oferecendo uma abordagem menos invasiva e mais acessível para a detecção precoce da doença. Com alta precisão e aplicabilidade em ambientes variados de cuidado, o exame pode ser uma peça fundamental para o avanço do diagnóstico de Alzheimer, tornando possível uma intervenção mais rápida e eficaz, e, consequentemente, uma melhor qualidade de vida para os pacientes. Com o avanço dessas tecnologias, o futuro da medicina está cada vez mais focado em oferecer soluções personalizadas e acessíveis, que respeitam a complexidade de cada paciente e promovem a saúde de forma integral.

Este exame, baseado em avanços da biotecnologia e da neurociência, não é apenas um passo em direção a diagnósticos mais precisos, mas também a uma abordagem mais humana e holística para o tratamento do Alzheimer. À medida que mais pesquisas são realizadas, a expectativa é de que exames como o APS2 se tornem um padrão na prática médica, democratizando o acesso ao diagnóstico precoce e ajudando milhares de pacientes ao redor do mundo a enfrentarem o Alzheimer com dignidade e suporte.

FONTE: https://jamanetwork.com/journals/jama/article-abstract/2821669?guestAccessKey=b45e8c05-4a44-401d-8656-0a6f9d6a8b6c&utm_source=silverchair&utm_medium=email&utm_campaign=article_alert-jama&utm_content=mostreadwidget&utm_term=100424&adv=