O Impacto da Obesidade nos Níveis de Testosterona: Uma Nova Abordagem para Diagnosticar a Deficiência Hormonal em Homens

A obesidade pode interferir na produção de testosterona em homens, mas diferenciar entre baixos níveis hormonais induzidos pela obesidade e deficiência verdadeira é um desafio. Um estudo recente investiga como a composição corporal se relaciona com a resposta hormonal, trazendo novas perspectivas para o tratamento.

ENDOCRINOLOGIA

Fábio H. M. Micheloto

10/28/20244 min read

A testosterona, um hormônio crucial para a saúde masculina, desempenha um papel vital em diversas funções, incluindo a regulação do metabolismo, a manutenção da massa muscular e a promoção do bem-estar psicológico. Contudo, o tratamento com testosterona em homens com obesidade e baixos níveis desse hormônio não é geralmente recomendado, uma vez que a distinção entre baixos níveis induzidos pela obesidade e deficiência real de testosterona pode ser desafiadora. Em face dessa dificuldade, um estudo recente investiga a relação entre a composição corporal e as respostas dinâmicas do eixo hipotalâmico-hipofisário-gonadal (HGH) em homens, buscando elucidar esse tema complexo.

Desafios na Diagnóstico da Deficiência de Testosterona

Para muitos médicos, a questão central é: como diferenciar a hipogonadismo (deficiência de testosterona) real da redução de testosterona relacionada à obesidade? A falta de ferramentas precisas para fazer essa distinção levanta preocupações sobre a abordagem clínica apropriada. Apesar de homens obesos frequentemente apresentarem baixos níveis de testosterona, nem todos os casos justificam a terapia de reposição hormonal. Portanto, uma avaliação detalhada dos fatores que influenciam esses níveis é essencial.

Objetivos do Estudo

O estudo foi realizado em um único centro, com o objetivo de investigar a associação entre a composição corporal e as respostas dinâmicas do eixo pituitário-gonadal em homens saudáveis. Para isso, foram recrutados 112 participantes que passaram por uma avaliação completa da biologia hormonal e testes dinâmicos para estimular a secreção de hormônios como LH (hormônio luteinizante) e testosterona.

Metodologia

Os homens incluídos no estudo foram submetidos a uma série de avaliações bioquímicas que mediram as concentrações basais de hormônios, bem como as respostas após a estimulação com GnRH (hormônio liberador de gonadotrofina) e hCG (gonadotrofina coriônica humana). Além disso, um subconjunto de 78 homens passou por uma varredura DXA para avaliar a composição corporal de forma mais detalhada.

Resultados Relevantes

Os resultados do estudo revelaram que um índice de massa corporal (IMC) elevado estava associado a uma diminuição nos níveis basais de LH, indicando que a obesidade pode ter um efeito direto sobre a função pituitária. O aumento de LH após a estimulação com GnRH não apresentou associação significativa com o IMC, sugerindo que a resposta dinâmica do eixo hipotalâmico-hipofisário pode ser menos afetada pela composição corporal do que as concentrações basais de testosterona.

Além disso, o estudo constatou que homens com IMC elevado apresentavam níveis significativamente mais baixos de testosterona total e livre. Em comparação a homens com peso normal, aqueles com sobrepeso e obesidade tinham concentrações de testosterona reduzidas em até 24%, além de uma queda de até 50% nos níveis de testosterona livre. Esses achados ressaltam a necessidade de considerar o IMC ao avaliar a saúde hormonal masculina, especialmente em contextos clínicos.

Outro dado importante foi que o aumento da testosterona estimulado por hCG foi menos dependente do IMC, ao contrário da influência do IMC nas concentrações basais de testosterona. Isso implica que, em situações de estimulação hormonal, a resposta pode ser mais robusta, oferecendo uma oportunidade de diferenciação no diagnóstico de hipogonadismo em homens obesos.

Implicações Clínicas

Os resultados deste estudo trazem implicações significativas para a prática clínica. A compreensão de como a composição corporal influencia a produção hormonal pode ser crucial na tomada de decisões terapêuticas. Para os médicos, a avaliação dos níveis basais de testosterona em pacientes obesos deve ser feita com cautela, uma vez que a presença de baixos níveis pode não necessariamente indicar hipogonadismo.

Além disso, a resposta dinâmica do eixo hormonal pode ser uma ferramenta valiosa na avaliação de pacientes obesos. Se os níveis de testosterona aumentarem de forma significativa após estimulação hormonal, isso pode indicar que o tratamento não é necessário. Em contrapartida, se as respostas forem baixas ou inexistentes, isso pode justificar uma abordagem mais agressiva na terapia de reposição de testosterona.

Conclusão

Em suma, o estudo oferece novas perspectivas sobre a complexa relação entre obesidade e níveis de testosterona em homens. Ao demonstrar que as respostas dinâmicas do eixo pituitário-gonadal são menos afetadas pelo IMC do que as concentrações basais, a pesquisa propõe um caminho inovador para a avaliação e tratamento da deficiência de testosterona em homens obesos. Essa abordagem pode melhorar a precisão dos diagnósticos e garantir que os pacientes recebam o tratamento mais adequado, evitando intervenções desnecessárias.

As descobertas enfatizam a importância de um olhar mais atento às nuances do diagnóstico hormonal e convidam à reflexão sobre como a medicina pode evoluir para atender às necessidades de uma população crescente de homens que enfrentam os desafios da obesidade e suas consequências para a saúde hormonal. A necessidade de diretrizes mais claras e ferramentas de diagnóstico mais eficientes nunca foi tão evidente, e o caminho para essa evolução começa com estudos como este, que abrem novas portas para a compreensão e o tratamento adequado das condições que afetam milhões de homens em todo o mundo.

Fonte: https://www.nature.com/articles/s41366-024-01518-2?fromPaywallRec=false